quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Senhoras e Senhores...


...João Manuel Pinto.

Esta é, sem dúvida, uma das melhores entrevistas a jogadores e ex-jogadores de futebol. Nem digo mais nada. Leiam e percebam vocês a razão.

"O Paulinho Santos detestava o João Vieira Pinto, aliás detestava o Benfica"

Este é João Pinto. Não confundir com o outro, o João Pinto do FC Porto, com quem jogou, nem com João Vieira Pinto, com o qual não fala desde 2001, depois de lhe ter cuspido na cara. Este não foi um artista mas jogou no Belenenses, no FC Porto e no Benfica. E ganhou oito títulos, todos no Dragão. Quando se fala de túneis e agressões, este João Pinto, o João Manuel Pinto, tem um par de histórias para contar. Na primeira, na segunda e na terceira pessoas.

Que é feito do João Manuel Pinto?

O João Manuel Pinto abriu agora uma escola de futebol aqui, em Tarouca, ao pé de Lamego. E está a correr bem, é uma coisa que sempre quis. Os meus sonhos sempre foram muito pequeninos. E concretizei-os quase todos. Mas também gosto de sonhar pouco [risos].

E o futebol deu-lhe aquilo de que precisava?

Obviamente gostava de estar muito melhor posicionado, como outros grandes craques, como o Rui Costa, e ter ganhado grandes salários [risos]. Mas primeiro a saúde e depois que venha o resto.

Mas teve juízo a gerir o dinheiro?

Sim, sim... Quer dizer, há sempre aquelas coisas da juventude. Sabe como são os jogadores de futebol com os carros de grande cilindrada. E eu não fugi à regra, não é? Comprei o meu Porsche Turbo - lá está, outro sonho desde pequenino, mas este era um sonho grande - quando fui para o FC Porto, em 1995.

Tinha 22 anos e vinha do Belenenses nessa altura. Como foi chegar ao FC Porto?

Fui muito jovem para o FC Porto e chego lá e vejo grandes jogadores, símbolos, mitos do clube. Dias maravilhosos com títulos, festas. O Jorge Costa era o maior, impunha as regras, profissionalismo, sempre a querer levar o clube mais longe. Mas o Paulinho, o André, o João Pinto... enfim... Está a ver a gama, não está? Foi um prazer aprender lá.

Foi Bobby Robson quem mais o marcou?

Sempre com um sorriso. Não era só o trabalho, mas o prazer que nos proporcionava a trabalhar. Divertíamo-nos. Eu era uma espécie de arma secreta dele, entrava a ponta-de-lança para marcar golos por ser alto. E a coisa dava resultado! Ele tinha um feeling especial para as substituições. O Bobby tinha arte no que fazia. As expressões... [risos]. Não falava bem português e dava-nos para rir. Era um treinador engraçado.

E porque é que o Jorge Costa é o Bicho?

Eh pá, por ser forte fisicamente, um comboio. Naquela hora e meia jogava a vida.

O João ganhou oito títulos e foi parar à equipa B. Como é que isso aconteceu?

Políticas, empresários - e o jogador às vezes é apanhado no meio. Havia uma rivalidade forte entre o meu manager, que era o Veiga, e o presidente Pinto da Costa - e paguei eu. Confiava no Veiga e, quando chegavam propostas do estrangeiro ao FC Porto para me contratarem, ia sempre dizendo que não, a conselho dele. "Não faças isso porque tenho outros interessados."

Arrependeu-se?

Temos segundos para decidir a vida. Não sabia o que fazer. Se previsse, teria escolhido sempre a opção certa.

Está-me a dizer que escolheu a errada.

Obviamente que não foi uma opção muito boa para mim, mas acabei por ir para o Benfica.

E como é que isso se processou?

A seis meses de acabar o contrato, recebi uma proposta do Sporting, porque o Veiga dava-se bem tanto com o Sporting como o Benfica. Mas a escolha foi do meu empresário e eu acabei por concretizar um sonho (este dos grandes!) porque sempre fui benfiquista! Era uma coisa de criança, mas perdi dinheiro.

E o FC Porto pagou-lhe o que devia?

Sim, sim. Não cumpriram comigo durante três meses por causa das politiquices, mas ficou tudo resolvido.

Chega ao Benfica e a capitão de equipa.

E em apenas seis meses! Foi tudo tão rápido... O Meira, que era o capitão, tinha ido para a Alemanha e o Enke, o capitão seguinte, deixou de jogar pelo Benfica. Depois era o Drulovic e eu na hierarquia.

E caiu bem no balneário? Afinal de contas, eram dois ex-FCP com a braçadeira.

Havia três... Três, não! Quatro, eu, Argel, Zahovic e Drulovic. E viemos para um clube que estava em reconstrução. Tinha tido aquele presidente que fez o que fez [Vale e Azevedo]. Quando entrei no Benfica fiquei de boca aberta com as condições do clube. Estava em cacos!

Mas em pouco tempo passou de titular e capitão a suplente.

Quando saiu o Jesualdo... O Chalana, no jogo de transição, põe-me de fora e o Miguel, que na altura não era este Miguel, a lateral. E o Camacho a ver aquilo da bancada. Pronto, a equipa ficou praticamente feita [3-0 ao Braga]. O Camacho trouxe cheiro a balneário e respeito.

Não havia respeito por Jesualdo?

Houve momentos em que alguns jogadores faltaram ao respeito. Ele não estava bem apoiado, sozinho a levar um barco. Tinha meia dúzia de jogadores com ele e o resto estava contra. Eu era um dos que estavam com ele.

E quem é que não estava com ele?

Não posso dizer.

Nem um?

[silêncio] Conhecemos o temperamento do Argel nos treinos, nos jogos. Obviamente que era um dos que não estavam com o Jesualdo. A gente nunca pode dizer nomes, mas basta ver quem jogava e não jogava. Quer dizer, depende. Há futebolistas que não sabem ficar no banco, como suplentes. Quando cheguei ao Benfica havia jogadores com a meia em baixo, sem caneleiras. Eh pá, por amor de Deus! O treino tem de ser um reflexo dos jogos. E às vezes entrava com uma certa dureza, para eles perceberem que não era assim. "Eh pá, olha aí que isto é um treino", diziam-me. E eu respondia-lhes: "Vai pôr caneleiras."

Por falar em caneleiras... Agora, no futebol português fala-se mais de túneis e de agressões do que em tácticas. Lembra-se do caso Weah?

Havia sempre alguns empurrões aqui e ali. Mas só estive realmente envolvido numa rixa horrível no célebre FC Porto-Milan [20 de Novembro de 1996, 1-1] nas Antas. Foi violento. Aquilo vinha de trás. O Jorge tinha pisado o Weah lá em Milão [3-2, para o FC Porto]. Todos vieram dizer que o Jorge tinha chamado "preto" ao Weah, mas conhecendo o Bicho não acredito nisso. O que aconteceu lá em Milão foi que o Jorge lhe pisou o dedo. E isso toda a gente sabe que foi de propósito. O Jorge era muito frio e físico, e o Weah teve o azar de ter marcado o golo e ter ficado no chão. O Jorge saltou e pisou-lhe o dedo, e o dedo ficou muito feio [risos]. No túnel das Antas foi tudo muito rápido e planeado pelos italianos. O treinador deles [Oscar Tabarez, uruguaio] fez um sinal ao Rossi para ir rapidamente para o túnel - e ele era grande, pá, nunca vi um guarda-redes tão grande como aquele homem! - e o Weah logo a seguir. O Jorge, inocente, não reparou. E quando olha para trás, o Weah manda-lhe uma cabeçada. Só vi o Jorge voar dois metros no túnel. E depois foi o que foi. Andámos todos ali à porrada.

E quem é que deu mais?

Só tive pena do [Edgar] Davids, coitadinho. Estava ali a querer serenar as coisas e foi o que levou mais.

Mas o João Manuel também teve os seus momentos. Como aquele com o João Vieira Pinto, quando um estava no Benfica e outro no Sporting.

Assumi a culpa. São coisas que não se deve fazer. Cuspi-lhe na cara e não o devia ter feito. Mas acredite que fiquei muito chateado com o João no último dérbi em casa, no velho estádio da Luz (2-2, 15 de Dezembro de 2001), quando ele disse aos jornais que eu devia ter sido expulso por ter dado muita porrada. O que é mentira, é só ver o vídeo! E eu disse para mim: "Para a próxima, cá te espero!" No jogo de Alvalade [1-1, 7 de Maio de 2002] andei o tempo todo à procura dele e não consegui ter nenhum contacto físico com ele... O treinador [Bölöni] pô-lo nas linhas e eu nunca consegui apanhá-lo a jeito para lhe dar uma fruta e lhe dizer ao ouvido algumas que não ficaria bem dizer aqui. Depois cuspi-lhe na cara e não o devia ter feito. No final do jogo tentaram apanhar-me, mas nós ficámos a bater palmas ao público e tal. Nunca mais falei com o João, nem ele tem nada de que falar comigo.

Então e no FC Porto como era ver os jogos com o Benfica e assistir ao clássico Paulinho Santos-João Vieira Pinto?

Não era nada fácil. O Paulinho era um jogador muito violento, queria ganhar tudo. Eu ria-me com aquelas coisas. Não aceitava, mas pronto - os clássicos são uma guerra. O Paulinho detestava o João. Perdão. O Paulinho detestava o Benfica e detestava o João por este ser o melhor jogador do Benfica na altura. Ele ia para a guerra com o objectivo bem definido: dar no João Pinto. Transformava-se noutra pessoa. E ninguém lhe podia dizer nada para o tentar acalmar porque senão ele ainda ficava chateado connosco!


(Retirado do Jornal i)


Entrevisticamente, a Administração.

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